{"id":46,"date":"2009-07-31T13:10:52","date_gmt":"2009-07-31T13:10:52","guid":{"rendered":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/2009\/07\/31\/opiniao-da-editora\/"},"modified":"2009-07-31T13:10:52","modified_gmt":"2009-07-31T13:10:52","slug":"opiniao-da-editora","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/opiniao-da-editora\/","title":{"rendered":"Opini\u00e3o da editora"},"content":{"rendered":"

por Laura Bacellar<\/p>\n

\"amores_3\"<\/a>No dia 4 de julho as autoras Karina Dias, Mariana Cortez, L\u00facia Facco e eu fizemos a 1\u00aa. Conversa L\u00e9sbica Liter\u00e1ria de Paraty durante a OFF FLIP. Foi muito interessante, com participa\u00e7\u00e3o acalorada de v\u00e1rias mo\u00e7as da plat\u00e9ia e uma discuss\u00e3o que se estendeu por boas duas horas.
Um dos temas levantados, e que ali\u00e1s sempre surge quando se fala de literatura l\u00e9sbica, \u00e9 se uma pessoa com sensibilidade e imagina\u00e7\u00e3o tem condi\u00e7\u00f5es de escrever um texto de tem\u00e1tica l\u00e9sbica \u2013 um homem como o Chico Buarque ou uma mulher hetero bem informada \u2013 ou se \u00e9 preciso ser uma l\u00e9sbica para tanto.
Essa discuss\u00e3o tem defensores fortes de ambos os lados. H\u00e1 uma nobre tradi\u00e7\u00e3o que diz que a literatura n\u00e3o \u00e9 document\u00e1ria mas arte, e que para fazer arte a pessoa precisa ter sensibilidade e usar sua riqueza interior. N\u00e3o precisa, assim, ter experimentado na pele tudo o que descreve.
A outra ala desse embate costuma dizer que sim, \u00e9 verdade que uma escritora n\u00e3o precisa ter vivido tudo o que coloca nas suas hist\u00f3rias (sen\u00e3o n\u00e3o existiria a fic\u00e7\u00e3o cient\u00edfica, por exemplo), mas pelo menos a ess\u00eancia ela necessita ter experimentado na sua alma, ou sua literatura soar\u00e1 falsa.
\u00c9 uma boa discuss\u00e3o. Uma das presentes argumentou que Kafka nunca virou uma barata gigante para escrever A metamorfose. Outra rebateu que ningu\u00e9m virou uma barata gigante para saber se a descri\u00e7\u00e3o de Kafka \u00e9 boa ou falsa…
Apesar de achar a troca de id\u00e9ias uma del\u00edcia, eu tenho uma posi\u00e7\u00e3o definida a respeito: literatura l\u00e9sbica precisa ser escrita por l\u00e9sbicas.
Como argumento, eu vou apresentar aqui nosso lan\u00e7amento mais recente, o livro
Amores cruzados<\/em><\/a>, de F\u00e1tima Mesquita.<\/p>\n

<\/p>\n

Eu conhe\u00e7o a F\u00e1tima faz j\u00e1 mais de dez anos, fui eu que publiquei seu primeiro livro \u2013 Julieta e Julieta <\/a>\u2013 pelas Edi\u00e7\u00f5es GLS. Essa obra foi um marco por ter sido publicada sem pseud\u00f4nimo e conter as primeiras hist\u00f3rias em l\u00edngua portuguesa com protagonistas l\u00e9sbicas e finais felizes. S\u00e9rio, at\u00e9 1999 s\u00f3 tinha personagem l\u00e9sbica suicida ou solit\u00e1ria ou alco\u00f3lica. Desde ent\u00e3o a autora lan\u00e7ou mais seis t\u00edtulos diferentes, dirigidos a outros p\u00fablicos, e s\u00f3 agora voltou a escrever para l\u00e9sbicas.
Amores cruzados \u00e9 uma hist\u00f3ria que eu achei deliciosa, com aquele ritmo e oralidade de que a F\u00e1tima \u00e9 mestra. Ela \u00e9 mineira, contadora de causos e tem uma pr\u00e1tica em textos para r\u00e1dio e televis\u00e3o enorme. Da\u00ed que seus di\u00e1logos s\u00e3o perfeitos, d\u00e1 para ouvir as personagens falando com total naturalidade, o livro acaba antes da hora de t\u00e3o prazerosos s\u00e3o os trinta dias em que acompanhamos Carolina em andan\u00e7as variadas.
Mas n\u00e3o \u00e9 s\u00f3 isso. O casamento entre as duas mulheres ressoa de t\u00e3o verdadeiro. Quem j\u00e1 viveu uma rela\u00e7\u00e3o longa com outra mulher com toda certeza vai reconhecer muitos de seus sentimentos ali, a rotina, o encaixe perfeito, as esquisitices. E as trai\u00e7\u00f5es, as brigas, o perd\u00e3o, aquela d\u00favida que a umas tantas bate sobre a rela\u00e7\u00e3o.
Nada disso \u00e9 exclusivo de l\u00e9sbicas, claro, mas n\u00f3s temos um jeito um pouco diferente de passar por esses altos e baixos dos relacionamentos. O meu argumento sobre o debate acima ent\u00e3o \u00e9 esse texto. Para mim, apenas uma l\u00e9sbica poderia ter escrito algo t\u00e3o caracteristicamente nosso. \u00c9 \u00f3bvio que ela n\u00e3o imaginou, mas viveu com outra mulher. E n\u00e3o uma noite apenas, mas muitos anos de trocas e acertos. E n\u00e3o escondida, mas assumida e resolvida.
Tudo isso passa atrav\u00e9s dos poros da hist\u00f3ria simp\u00e1tica e cheia de pequenos enigmas sobre Carolina, Gisa e uma admiradora secreta. E s\u00f3 passa porque \u00e9 verdadeiro. Na minha opini\u00e3o, nem em um milh\u00e3o de anos um homem ou uma mulher hetero escreveria algo como Amores cruzados.
Esteja \u00e0 vontade para discordar, mas leia e veja se eu n\u00e3o estou falando a verdade…<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

por Laura Bacellar No dia 4 de julho as autoras Karina Dias, Mariana Cortez, L\u00facia Facco e eu fizemos a 1\u00aa. Conversa L\u00e9sbica Liter\u00e1ria de Paraty durante a OFF FLIP. Foi muito interessante, com participa\u00e7\u00e3o acalorada de v\u00e1rias mo\u00e7as da plat\u00e9ia e uma discuss\u00e3o que se estendeu por boas duas horas.Um dos temas levantados, e […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[5],"tags":[],"builder_content":"","_links":{"self":[{"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/46"}],"collection":[{"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=46"}],"version-history":[{"count":0,"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/46\/revisions"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=46"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=46"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/editoramalagueta.com.br\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=46"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}